Alfredo Soeiro: “Ha que distinguir dois aspectos a mulher pelotari e a mulher dirigente. No primero caso já existem modalidades esportivas de alto nível practicadas por mulheres, no entanto creio que há poucas mulheres dirigentes e isto é novo”

Arantxa Ugartetxea Arrieta
Euskara
Español

Dr. Alfredo Soeiro, o senhor atualmente é o Presidente da Federação de Pelota Basca do Brasil. Levando em consideração esta realidade e contando com sua amabilidade, gostaria que nos contasse resumidamente os passos históricos mais interesantes da federação até a atual participação no campeonato mundial de Pamplona (2002).

Em primeiro lugar gostaria de falar algo sobre os primórdios da “pelota basca” no Brasil. No final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX havia vários “frontões” de “jai alai” no Brasil, além de ser comum a prática de “pelota mano”, com bolas de tênis descascadas em “frontões” pequenos (15 m de comprimento), principalmente por remadores do Rio de Janeiro e de São Paulo. Infelizmente houve uma involução e maioria destes “frontões” fecharam e quase desapareceram. Restam em atividade o “Frontão” do Clube Athlético Paulistano (31m de comprimento), o “Frontão” da Casa Vasca de São Paulo (25 m de comprimento) e o do Clube Banespa (15m de comprimento) em que ainda se pratica a modalidade de pelota mano com bolas de borracha com um oco no seu interior.

Quando cerraram os “frontões” profissionais no Brasil (1946) os “pelotaris” de “jai alai” continuaram a treinar na cancha do Clube Paulistano sempre esperando a volta dos jogos profissionais, o que não ocorreu. Toda a organização do “jai alai” neste clube era feita por Marcello Fernandes, que além de “pelotari” cuidava da compra e manutenção do material, cestas e pelotas. Em 1972 comecei a apreender “jai alai” com o Marcello e continuo praticando até hoje. Em 1986 ele faleceu e perdemos o nosso grande líder, aos poucos fomos ficando sem material para praticar o “jai alai”, que estava morrendo. Alguns “pelotaris” já tinham comprado raquetes para jogar squash porque acreditavam que o “frontão” (que é a palavra usada em nosso meio para designar o jai alai) havia morrido.

  Argazkia
Alfredo Correia Soeiro, Arantxa Ugartetxea.

Em 1987, por iniciativa própria, sem conhecer ninguém do universo da “pelota basca” fora do Brasil, fui para San Sebastián para comprar cestas e pelotas. Hospedei-me no Hotel Orly, e perguntei na recepção se poderiam me indicar algum lugar aonde vendessem cestas e pelotas. Uma recepcionista deste hotel tinha um filho pelotari e imediatamente telefonou para ele; uma hora depois recebi um bilhete dizendo para eu ir no dia seguinte a rua Aldamar número 5, às 9h da manhã. No horário marcado estive no local e fui recebido gentilmente por um senhor que ficou surpreso em saber que no Brasil existia um grupo de praticantes de “cesta-punta”. Posteriormente fiquei sabendo que estivera na sede da Federação Internacional de Pelota Vasca e que este senhor era Jesús Fernandez Iriondo, presidente da FIPV. No dia seguinte, ele me levou de carro até Gernika para assistir uma partida de “jai alai” e me apresentar ao cesteiro, Sr. José Echave.

A emoção foi muito grande pois era a primeira partida oficial de “cesta-punta” que eu assistia e também porque estava resolvendo o problema da compra de material desportivo, que era o principal motivo da minha viagem. Naquele momento tive a certeza de que o “frontão” não iria morrer no Brasil. No ano seguinte, a FIPV passou a me enviar correspondência, comunicando as suas atividades. A seguir, por influência da FIPV, recebemos uma carta convite de Cuba para participar da Copa Capitán San Luiz em Havana – 1989. Começava a germinar a Sociedade Brasileira de Pelota Vasca.

Que expectativas uma federação como a de vocês tem quando viaja para participar dos mundiais?

A nossa expectativa inicial era de participar e de apreender. Atualmente já surge um certo espirito competitivo, embora sabendo que ainda não temos condições para aspirar medalhas, procuramos tentar ganhar ou ao menos não fazer feio contra países que também não são fortes, desportivamente falando.

Como Presidente alimenta expectativas pessoais?. Como é manter e fortalecer uma atividade esportiva fora do meio cultural de origem, isto é, especialmente na cultura brasileira?. Poderia falar-nos dessa interculturalidade da “pelota basca”?

Ao percorrer o País Basco vi uma grande quantidade de “frontões” em toda a parte. Na maioria das cidades pequenas que visitei, existe na praça central uma igreja, o prédio da municipalidade e um “frontão”. Em Markina observei um pai ensinando seu filho pequeno (+/- 7anos) jogar “pelota mano” na “cancha” formada pelas paredes de uma igreja antiga. A atividade esportiva no País Basco está toda ela voltada para o máximo desenvolvimento corporal através do uso das mãos e dos braços. No Brasil a atividade esportiva principal é o futebol e o desenvolvimento corporal é feito a partir dos pés e das pernas, além de ser um esporte de contato em que os choques corporais fazem parte do jogo. Atualmente isto está mudando um pouco e outros esportes estão ganhando espaço: bola ao cesto, voleibol, tênis,... Esta diferença cultural mãos-braços X pés-pernas talvez dificulte a aceitação mais rápida da “pelota basca” em nosso país.

Outra questão interessante é que o esporte basco é ambidestro, com exceção das modalidades de cesta (embora nesta modalidade os indivíduos naturalmente canhotos são induzidos a jogar com a mão direita), enquanto que no futebol, apesar de ser jogado com ambos os pés, não costuma ser dada muita ênfase para o desenvolvimento da ambidestria. Embora eu não seja especialista em medicina esportiva, ou em educação física, creio que seria muito interessante estudar as repercussões interculturais destas diferentes atividades desportivas e até mesmo fazer um estudo anátomo-fisiológico cerebral comparado, para verificar se existem diferenças significativas, possivelmente induzidas por estas diferentes formas desportivas.

Argazkia

Que qualidades ou características considera necessárias num “pelotari” brasileiro?. Que traços, em sua opinião, caracterizam o jogo da “pelota basca”?. As diferenças culturais definem o estilo de um time?

Não estou capacitado a responder adequadamente esta pergunta porque a “pelota basca” ainda é muito incipiente em nosso país. Creio que na época do profissionalismo, nas primeiras décadas do século XX, pudesse ser sentida alguma diferença no modo de jogar dos “pelotaris” brasileiros mas isto é apenas uma suposição. A notícia que tenho é que eram “pelotaris” muito bons e que muitos deles foram jogar em outros países, principalmente na China, quando cerraram os “frontões” no Brasil. Uma sensação que tenho é que os “pelotaris” brasileiros, que em sua grande maioria praticaram futebol na infância, gostam muito do deslocamento corporal dentro da cancha, talvez devido a ênfase dada ao movimento dos pés e das pernas neste esporte nacional. Uma das coisas que sinto quando assisto partidas de “jai alai” é que devido ao grande tamanho das canchas o jogo fica muito centralizado nos zagueiros e que muitos pontos tornam-se longos e monótonos devido a repetição exagerada dos mesmos movimentos; convém lembrar que eu sou um apaixonado pelo “jai alai” e sinto isto, imagine as sensações de um público leigo.

Eu propus para a FIPV que houvesse jogos de “cesta-punta” em canchas pequenas (36 m) porque nestas canchas o jogo é muito mais vivo e dinâmico e não há tanta centralização nos zagueiros. Assisti no México dois “pelotaris” profissionais de alto nível jogando mano a mano numa cancha de 36 metros e a partida foi espetacular. Durante o Mundial de Pamplona tive contato com um “pelotari” basco, ex-profissional nos EUA (não sei o seu nome), e falei a respeito desta proposta e ele me disse que há 40 anos atrás ele jogava “cesta-punta” no “frontão” Anoeta de Donostia e que é perfeitamente possível jogar mano a mano ou jogar de duplas em “frontões” curtos (36m). Se isto for verdade resolveria um problema grave, existente na escolha de países sedes para os campeonatos mundiais, pois vários países não podem ser sedes de mundiais porque não possuem canchas grandes (55m) embora tenham grande tradição em “pelota basca” como é por exemplo o caso da Argentina,

O futuro do esporte está nas mâos do esportista amador ou profissional?

Eu creio que o esporte profissional serve de incentivo ao esporte amador, entretanto a forma de apostas durante as partidas não é comum em outros esportes, tais como: futebol, bola ao cesto, tênis, badminton. Nos outros esportes o profissionalismo é sustentado pelo marketing, pelos ingressos,... e não pelas apostas durante os jogos. Embora no País Basco a prática da aposta durante as partidas seja usual, creio que o mesmo não ocorra com outros esportes em outras partes do mundo. Talvez esta prática não devesse ser incentivada em outros países em que se procura desenvolver a “pelota basca”, porque pode se chocar com a mentalidade destes outros povos. Tanto é assim que o jai alai profissional desapareceu em vários países, Argentina, Brasil, Cuba, México,... quando foram proibidos os jogos de azar.

Como vislumbra o futuro da “pelota basca”?. Qual é sua opinião sobre a “Seleção de Euskadi”?

A “pelota basca” veio para ficar embora o seu crescimento em nível mundial esteja sendo mais lento do que seria desejável. O esporte para se desenvolver precisa ser bonito e agradável de ser visto pelo público leigo. Não basta ser admirado apenas por pessoas que o pratiquem ou que tenham praticado na juventude. Uma vez propus para a FIPV que as partidas de “jai alai” fossem divididas em sets e não em pontos corridos como é hoje. Fizeram uma experiência em San Juan de Luz e o público gostou muito, no ano seguinte repetiram a experiência e parece que não foi tão bem recebida. A nossa proposta era de se jogar a “cesta-punta” em dois sets de 15 pontos e se houvesse empate de 1 a 1 haveria mais um set de 10 (ou 15) pontos que definiria o vencedor. Qualquer mudança sempre pode encontrar resistência e interesses contrários e neste caso eu não sei se esta nova modalidade de contar os pontos podem atrapalhar as apostas. Imaginem se quisessem fazer com que o tênis fosse jogado em pontos corridos, creio que perderia mais de 60% do seu encanto. Não sei se a nossa proposta foi a mais acertada, mas sinto que é necessário inovar para tentarmos tornar a “pelota basca” mais atraente e emocionante para a platéia. Quanto à “Seleção de Euskadi” eu a comparo ao nível dos jogadores de bola ao cesto profissional dos EUA, os “pelotaris” jogam muitíssimo bem, são verdadeiros artistas e esportistas excepcionais.

Na Federação Brasileira existem muhleres “pelotaris”. De que modo esta circunstância concreta contribui para a “Pelota Basca” no Brasil?

Há que distinguir dois aspectos a mulher “pelotari” e a mulher dirigente. No primeiro caso já existem modalidades esportivas de alto nível praticadas por mulheres, no entanto creio que há poucas mulheres dirigentes e isto é novo. Há cerca de 10 anos atrás enviamos a Sra. Soraya Cuellas como representante do Brasil para uma reunião promovida pela FIPV. Salvo engano, acredito que esta tenha sido a primeira e talvez a única vez em que uma mulher tenha representado um país numa reunião oficial de “pelota basca”. Julgo que as mulheres, como dirigentes, poderiam contribuir e muito para o desenvolvimento da “pelota basca”.

Penso que existem vínculos entre as diferentes federações da “Pelota Basca”. Como precisaría ser a vinculação com o “País Basco” e a “Seleção de Euskadi”?.

Julgo que o estabelecimento de vínculos entre federações esportivas é altamente salutar. É próprio do esporte incentivar a comunicação e a amizade entre os povos, os esportistas adoram viajar e durante as partidas sentem os outros como adversários mas não como inimigos. Mesmo na derrota admiram os seus adversários e procuram aperfeiçoamento para poder derrotá-los no futuro. O estabelecimento de contatos com os desportistas bascos é um sonho para qualquer país que queira desenvolver a “pelota basca”, é o mesmo que dissemos a respeito do bola ao cesto dos EUA, qual seria o país, ou jogadores de bola ao cesto de outros países, que não gostariam de manter contato com os profissionais da NBA? Enfim, quanto maior a troca esportiva com técnicos e “pelotaris” bascos melhor.

Argazkia

Ouvimos falar das diferentes modalidades de “Pelota Basca”, inclusive de um número excessivo delas. Qual é sua opinião a respeito?

Este tem sido um problema difícil e complicado para o trabalho da FIPV, que tem procurado equacioná-lo da melhor maneira possível. Julgo que todas as modalidades têm os seus admiradores e sua beleza, mas para a organização e desenvolvimento do esporte este é um problema sério. Não tenho uma opinião definida a respeito mas sinto que em alguns casos é absolutamente necessário a existência de canchas adequadas para o direcionamento e fortalecimento das modalidades. Como exemplo, cito o Peru que tem cerca de 12000 “pelotaris” filiados a sua federação, mas não possuem uma cancha de 3 paredes, embora possuam centenas de frontões aonde jogam com raquetes e bolas de borracha.

Na origem da Federação Brasileira, sei que o senhor mesmo costurava as bolas e cuidava das cestas, pois a “cesta-punta” é a sua paixão esportiva. Gostaria que nos contasse alguma coisa sobre os diferentes materiais que considera útieis a partir da prática do esporte da “pelota”.

Durante 12 anos costurei e reformei bolas de “jai alai”, inclusive cheguei a fazer alguns núcleos de borracha. Este trabalho é muito desagradável para quem não é profissional da área e talvez, se eu tivesse parado de costurar as bolas, a cesta punta houvesse desaparecido do Brasil, por não haver ninguém que se interessasse em fazer este trabalho. Pode parecer incrível mas esta é a nossa realidade. Felizmente há 2 anos atrás, em contato com um amigo – Ciro Nogueira - que tem uma fábrica que trabalha com material plástico, pedi a ele que fizesse bolas para o nosso jogo. Depois de algumas tentativas ele fabricou uma bola que estamos utilizando há 2 anos e que é muito adequada para a nossa cancha. É oportuno lembrar que a nossa cancha tem apenas 31 metros de comprimento.

Pedi-lhe que procurasse fazer uma pelota para frontões de 55 metros, ele me atendeu e fez uma pelota, que embora não tenha o mesmo sonido das bolas tradicionais, apresenta velocidade, peso e volume próximas da bola usual, com a vantagem de não desviar de direção pelo efeito do atrito do ar contra a costura. Como no Brasil não existe um frontão largo para testar esta bola, enviei-a para vários lugares, inclusive para a região basca, mas a resposta foi decepcionante, simplesmente ela bota demais. Perguntei por email, demais quanto? 10%, 20% ou 50%? Este dado era muito importante para que o Sr. Ciro Nogueira pudesse fazer as modificações necessárias para tentar chegar a bola ideal, mas não obtive resposta, parece que não há interesse de mudar o tradicional, porque a construção e reforma de bolas deve ser o ganha pão de muita gente. Ou talvez a fabricação de bolas sintéticas tenham que ser feitas somente no País Basco e não em outros países, quem sabe! O triste desta história é que pessoas de tão boa vontade e competência como o Sr. Ciro Nogueira não tenham tido nenhum incentivo para continuar o seu trabalho de pesquisa.

O alegre e importante é que eu já não preciso mais costurar bolas para que o jai alai continue a existir no Brasil. Ao meu ver, a disponibilidade de material esportivo de boa qualidade, barato e resistente é muito importante para o desenvolvimento e manutenção da pelota basca no mundo. Neste sentido, aproveito a oportunidade para homenagear o Sr. José Echave, já falecido, de Gernika, que trabalhou durante muitos anos criando e aperfeiçoando cestas com material sintético, que são de excelente qualidade, grande resistência e durabilidade, e também a empresa Markinako que fabricou cestas e bolas de plástico para crianças que estão iniciando o aprendizado do “jai alai” e que as estamos utilizando no Brasil com muito sucesso. Parabéns!

DR. ALFREDO SOEIRO, MUITO OBRIGADA POR NOS CONCEDER A OPORTUNIDADE DE PODERMOS REFLETIR JUNTOS SOBRE ESTE NOSSO ESPORTE NACIONAL BASCO. MUITO OBRIGADA!.

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